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terça-feira, 17 de janeiro de 2017

ROSAS AO MEU PAI

Sei de que bastará uma linha, mas preciso mais.
Gerson, você, meu pai. Uma longa trajetoria, feita de muitos desacertos.                       Definitivamente, não nasceu para o mundo dos homens.  Com sua veia artística incompreendida, necessidade de falar mais alto, e nunca calar.
Lembro-me de você, vagamente, em minha infancia.  Aonde estaria, não em meus jogos de ficar adulta. Porque me bateu naquele dia, em que me retirando a coberta, viu meu corpo nu de criança.  Voce foi meu derradeiro encontro com o medo.  Do qual anteciparia por sempre, pois seu local de desejos sempre foi uma sombra.
Entrei a adolescencia vendo-lhe sem forças, à beira de uma cama, meu primeiro encontro com sua depressão.  Que se repetiu por outras vezes, junto à sua mania, seu tom, e covardia, quem sabe.
Mas você me fazia sua confidente, sem que eu lhe tivesse pedido tal.  E, foi por sua boca, que eu soube houvesse outra mulher em sua vida.  Porque eu a descobrí-lo, se tampouco a isso me destinava, não sei.  Nosso elo foi inconscientemente forte, e eu me curvei à sua presenca.
Você, meu pai, estêve mais presente com sua violencia, do que em palavras.  Quando aconteceram, se tornaram momentos sublimes, porque me senti simplesmente filha, sem outro dever, do que não eu mesma.
Mas foi extremamente duro conviver com seus fantasmas e, de tanto, me fica um nó pelos pensamentos que não perpasso.
Lembra-se de quando lhe escrevi de para que cuidasse da rosa em voce ?  Tornou-se seu hino, que voce parafraseou para alguma plateia. Talvez tenha me amado, no seu jeito de ser tão inconstante e imprevisto.
Apesar de tudo, voce me esperou. Com a docilidade dos que ja são entregues, e não se olvidou de brindar sua morte, em minha companhia.  Proporcionou-me um dos momentos mais cálidos, em vida. Seu rosto sereno, ao partir.
Dele, absolutamente, não me esqueco, e vão-se alguns anos.  A imobilidade do que ja não é, e minutos olhando ao que já se foi.  Feitos ou não, dia após, foi a terra que o recebeu.  E, nela, levou tudo.  Medo, frustração, todos os afetos que carreguei, ao longo dos anos.
Vi-me aberta a perdoar, como você o tenha.  Nossa magoa foi mutua, mas existe um momento derradeiro em que, dela, nada mais jaz.
O que se seguiu possa ter sido o esperado.  Despi-me de minhas roupas de menina, e enxerguei o homem.  Dominado por um transtorno terrivel, sem paradeiro e encontro, infeliz em sua procura.  E, a ele, tambem chamei meu pai, já sem vestes.  E veio a libertação, que o manto da morte trouxe, houvera cálida.
Não tenho palavras para enaltecer os momentos bons, que também foram muitos.  Insistimos em nos fortalecermos através da dor, quando a cintilancia do belo também nos oferece.
Você foi o primeiro a escrever uma redação comigo, e ela ganhou os céus numa classe.  E, dai, quem sabe, um começo.  E com absoluto carinho que lhe agradeço a sensibilidade.
Fui trangressora desde muito cedo, por temperamento e virtude, o que não lhe deixou opções, dentro de um coração que já se sabia amargurado.  Mas, quem sabe, eu poderia intuir que minha força lhe agradasse, porque não eramos convencionais.   De qualquer forma, os conselhos impostos, que decidi por bem desprezar, não fariam parte da constelação de minhas procuras.
De um ciúme tão grande, que a mim só receio.  Embora parte ao ser humano, destrutivo e castrador, sinônimo da não procura em nós mesmos.
Mas não tenho magoa.  Ao contrario, reverencio sua espera para que nos despedissemos, e desconfio menos do momento derradeiro, tal a paz de seu semblante.
Gerson, meu pai, varias vezes tenho saudade.  De um momento que, talvez, ainda não tivesse acontecido, e não importa.
As relações são complexas, mesmo em parecendo planar por águas suaves.
De você me fica a descoberta por ideais, homem de convicções e honestidade.  Não feito para o mundo de fora, menino na sua teimosia.
E, assim, vão se passando os anos, e a visão de seu jazigo, que nunca visitei, apesar das promessas.
Na próxima vez, irei.  Serei tomada pela beleza silvestre do lugar, e me lembrarei de uma vida, que acabou só, como todas.
Descanse em paz.  Voce merece.  Junto às rosas de que cuidou, ou não.  Lembro-me delas com carinho.

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