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domingo, 3 de março de 2019

PASSOS LARGOS ( PARA ARTHUR LULA DA SILVA )

Eu não exatamente o que aprendi nesses últimos dias, mas parece ser tão pesado, valer tanto. Como se, talvez, só agora despertasse para a verdadeira dor humana. Algo meio anestesiado e atônito, que nem o choro alivia. Um torpor, e acabei de voltar de uma caminhada. Nem numa cela estou.
Devo estar, se o que me resta é o mundo dos homens, do qual faço parte e me debato. Não é possivel a dor acumulada, nem a face da morte de uma criança.
Deixe-me limpar a face suja de sangue com o qual matei seus algozes, mas não lhe libertarei. Porque o seu perdão já existia em si mesmo antes de qualquer gesto, e eu não entendi. Porque não pude, talvez, ou não o quis. Não sofri, na carne, a perda do puro e do fresco, que jâ não existe, tão ainda parte de mim. Porque tenho um orgulho e brio que os tempos não derrubam, as calmarias não seguem, os temporais não agridem. Tenho a mim, e me basta.
Por onde irei, colherei frutos. Aceno minha mão, consciente de minha força, nada preciso dizer. Meu silencio é cúmplice. Meus olhos estão cansados da dor que se carregou em vida, e da fadiga das celas de todos os dias repletos das injustiças acovardadas, dos pensamentos mesquinhos, das lembranças de veludo de como se poderia ter sido bom. Apenas porque não o foi. A humanidade, simplesmente, está acobertada de intransigencias, dissabores e loucuras. Chamam odio ao que não o é.
Ele era um lindo menino loiro, sorridente, de cabelos encaracolados. Queria viver. Merecia seguir sua trajetoria, conhecer os pássaros, ir a escola, tocar um instrumento, ler um livro. E ter um avo livre. Nada, praticamente, conseguiu alcançar, no curto espaco de seu momento de vida.
Diz-se que as crianças não deveriam morrer, verdade inconteste. Na sequencia natural da vida, elas deveriam apontar para o futuro, e nos deixarem a esperança de que fizemos algo bom. Como deixar de que voce se vá ? Porque acreditarmos no reencontro ?
Eu não sei quem é Deus. Se Deus são os montes, os rios e as flores, que o chamemos montes, rios e flores. Assim se expressa Fernando Pessoa, e concordo. Mas é fácil pensar-se num Deus panteista. Pensá-lo na tragedia, na sordidez do ser humano é muito mais contraditorio. Onde está Deus nesse mar de insensatez e degradação humana ? O preço do culto a Deus a tamanho nivel de crueldade para com o semelhante ?
Meu pequeno anjo loiro, será que exista um lugar onde voce estará em paz ? Longe dos céus desse planeta ? Perto de muita luz, e água cálida, para molhar seus cabelos, e banhar seus pezinhos. Quem sabe voce encontre outros anjinhos tão belos como você. Que haja um parque de diversões bem grande e bonito para voces brincarem.

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